A madeira dos móveis da sua casa é sustentável?
Encontramos essa publicação interessante da Karine Serezuella em Colaboração para o UOL, de São Paulo em 3/02/2016.
A marca e a nota fiscal não bastam para garantir a origem da madeira do seu móvel
De onde vem a madeira usada na produção de mobiliário? O sofá e as cadeiras que você tem na sua casa são “sustentáveis”? E o que define o conceito de sustentabilidade, quando o assunto tratado é a extração desse recurso natural? Entre tantas dúvidas e questões, é preciso, em primeiro lugar, esclarecer: nem toda madeira legal é sustentável.
Dá pra ter certeza?
Existem muitos intermediários entre a origem do lenho e o ponto final de venda, o que atrapalha bastante a vida do consumidor ao tentar conferir de onde a madeira vem. Por isso, é tão difícil garantir que aquele material que dá corpo ao seu armário é, de fato, legal e sustentável apenas consultando a documentação oficial ou, ainda, a nota fiscal. Contudo, “perguntar sobre a origem da madeira é sempre uma forma de pressionar e, portanto, é válida”, salienta a agrônoma Marina Lacôrte, da campanha “Amazônia”, do Greenpeace Brasil.
Para a gestora ambiental e coordenadora de certificação do Instituto de Manejo de Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Evelin Fagundes, os selos que atestam certificações independentes (não atrelados a interesses provados ou governamentais) são uma forma eficiente de apontar a procedência da madeira. “Quando você opta por comprar um produto com o selo FSC, por exemplo, você usa seu poder de escolha e dá preferência para um móvel que tenha uma origem mais sustentável”, diz Fagundes.
Um bom exemplo
A secretária executiva do FSC Brasil (Forest Stewardship Council – em português, Conselho de Manejo Florestal), Fabíola Zerbini, explica que o selo avalia não só os princípios de manejo na floresta (veja mais abaixo), mas também rastreia a madeira em todas as etapas do processo produtivo, através da certificação da cadeia de custódia. “Mesmo apresentando alguns problemas, como a existência de serrarias que processam em um mesmo espaço madeiras certificadas e não certificadas, atualmente o selo FSC é o que mais garante que a madeira veio de onde ‘diz’ vir. Infelizmente, por competir com um mercado que opera em um nível tão alto de ilegalidade, empresas que adotam o FSC perdem força e ficam em desvantagem no que se refere ao preço (final)”, pondera a agrônoma do Greenpeace.
Para ter uma ideia do tamanho do imbróglio, de acordo com dados do instituto de pesquisa Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), entre 2011 e 2012, 78% da exploração madeireira do estado do Pará (maior produtor e exportador de madeira da Amazônia) foi ilegal. No caso do Mato Grosso, nos anos de 2012 e 2013, 46% da madeira extraída não obedecia ao processo legal. Mas o problema não para por aí: planos de manejo muitas vezes são utilizados de maneira incorreta e muita madeira ilegal vem sendo documentada de forma fraudulenta, para que o material obtido de maneira predatória consiga o ‘status’ da legalidade e passe a ser facilmente vendido no Brasil e no mundo. O alerta é feito por Lacôrte, que ainda afirma que “o Greenpeace vem sistematicamente expondo casos dessa natureza desde maio de 2014”.
Quem é quem na marcenaria
Madeira certificada
É a madeira que carrega um selo de uma certificadora independente (não ligada a empresas ou governos). Esse lenho necessariamente atende a critérios mais rigorosos do que aquela originária de um plano de manejo comum, além de obedecer regras visando os interesses sociais e não apenas ambientais, como oferecer condições dignas de trabalho e respeitar povos indígenas e comunidades residentes na área florestal.
Madeira de demolição
É a madeira descartada e que já teve um primeiro uso, por exemplo, proveniente de um piso antigo retirado durante uma reforma. O problema da madeira de demolição é que não há como comprovar sua origem, se vem de um desmate sustentável ou não. Mas o modelo, por ser uma forma de reciclagem, pode ser considerado uma boa alternativa para a conservação ambiental.
Madeira reaproveitada ou recuperada
É a madeira processada obtida por descarte ou através de um ponto de recuperação, por exemplo, uma recicladora. Assim como a madeira de demolição, mesmo que não se saiba a origem do lenho, esse tipo de reaproveitamento é válido e considerado “eco friendly”. Nessa categoria, não entram os resíduos florestais, ou seja, recursos que ainda estão na floresta.
Madeira ‘de resíduo’
É a madeira advinda de resíduos da exploração florestal: galhos, sapopemas e restos de troncos e árvores caídas. Os métodos e procedimentos a serem adotados para a extração e mensuração dos resíduos da área explorada deverão ser descritos no Plano de Manejo Florestal Sustentável, assim como o uso a que se destinam, conforme diretrizes técnicas do órgão ambiental competente (Instrução Normativa Ministério do Meio Ambiente nº 2, de 27/06/2007).
Madeira ecológica
É o termo usado para identificar algum aspecto ecológico do produto ou da sua produção. Pode corresponder a algum dos tipos de madeira já citados acima ou, até, ser erroneamente usado, por exemplo, no caso de móveis feitos de plástico com aparência de madeira. Nesses casos, tal denominação pode ser fruto da chamada “maquiagem verde” (ou atribuição de um caráter sustentável e amigável com o meio ambiente a produtos que não os detêm), já que o plástico é um recurso não renovável (ao contrário da madeira), produzido a partir de combustíveis fósseis.
Madeira legal: formas de obtenção
Desmate
A primeira (e mais simples) forma de extrair madeira legalmente é via desmate (corte raso) de parte de uma propriedade particular, na proporção permitida e com autorização do órgão ambiental responsável. Por exemplo, na Amazônia é permitido desmatar 20% de uma área privada para possibilitar outros usos do solo. “Do ponto de vista do Greenpeace, esse modo de se obter madeira nativa é legal, porém não é sustentável”, afirma a agrônoma Marina Lacôrte.
Manejo
A madeira legal pode, também, ser originária de um plano de manejo florestal, que deve assegurar a renovação e a manutenção do recurso natural. O analista de conservação do
WWF-Brasil, Ricardo Russo, explica que, em uma floresta manejada de maneira responsável, a exploração é planejada e seletiva o que leva a uma regeneração natural do ecossistema. Assim, segundo afirma Marina Lacôrte, na teoria, essa forma de extração madeireira é tanto legal, quanto sustentável e uma boa alternativa para que a floresta permaneça em pé.